EDUCAÇÃO FÍSICA - IFMT - campus São Vicente

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OBJETIVO DO BLOG: proporcionar um espaço de reflexão sobre os elementos da cultura corporal de movimento (jogos, dança, lutas, ginástica, esporte, expressão corporal) e suas relações com a educação, lazer, saúde, ludicidade, cidadania, socialização etc.

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terça-feira, 20 de julho de 2010

Nacionalismo via futebol - Em 1970 e 2014


De quatro em quatro anos vemos no Brasil o que alguns estudiosos chamam de "nacionalismo cíclico", decorrente da paixão pelo futebol e da torcida pela seleção brasileira nas Copas do Mundo de Futebol. Este nacionalismo é em grande parte estimulado pela mídia, mas é fato que brasileiros de todos os cantos do país se sentem mais orgulhosos em vestir a camisa da seleção e exibir as cores nacionais, enfeitam fachadas de suas casas, do comércio, dos shoppings e prédios públicos, podemos ver bandeiras do Brasil ou nas cores verde e amarela em carros, janelas etc.

Sendo assim, compare o hino "Pra frente Brasil" da Copa de 1970 com o comercial "Brasil - bem-vindo 2014" do Banco Itaú, e expresse sua opinião sobre o nacionalismo cíclico. 








  







Copa do Mundo - Futebol e orgulho nacional




Se o futebol desperta imenso interesse em quase todo mundo, é por ser mais que um jogo. Se a Copa do Mundo provoca, de quatro em quatro anos, entusiasmo mesmo em quem não acompanha cotidianamente o futebol, é porque ela não é apenas uma disputa esportiva. Sua história é, em certo sentido, a história do mundo contemporâneo.

Por exemplo, as Copas do Mundo corporificam o orgulho nacional. A primeira edição foi organizada em 1930 pelo Uruguai para festejar o centenário de sua independência. No dia da partida decisiva de 1934, o importante jornal italiano Corriere della sera escreveu que hoje “seremos invadidos pela divina paixão que inevitavelmente está em tudo o que é nosso, em tudo que tem a marca da nossa raça”. Em 1954, a Alemanha, debilitada material e moralmente pela Segunda Guerra Mundial, recuperou o amor-próprio e o respeito internacional graças à inesperada conquista da Copa. O mesmo evento, em 2006, permitiu a esse país manifestações patrióticas até então evitadas devido ao sentimento de culpa pelo passado nazista. Em 1986, Maradona reconheceu que a partida contra os ingleses era bem mais que futebol, era revanche pela derrota na guerra das Malvinas, alguns anos antes.

Nas Copas do Mundo emergem diversas rivalidades. Em 1930, o consulado uruguaio em Buenos Aires foi atacado por uma multidão inconformada com a derrota para o país vizinho. Em 1938, a partida entre Áustria e Hungria foi uma verdadeira batalha, refletindo as tensões não resolvidas das longas décadas em que as duas nações tinham vivido politicamente unidas e culturalmente afastadas. Em 1950, a Argentina recusou participar da Copa simplesmente porque ela ocorreria no Brasil. Em 1974, a seleção alemã foi vaiada em Hamburgo porque nela havia muitos jogadores do Bayern de Munique; quatro dias depois, porém, o público da mesma cidade apoiou com fervor o time diante dos irmãos inimigos da Alemanha Comunista.

Governos de todas as colorações políticas sempre depositam muitas expectativas nas Copas. O famoso telegrama que Mussolini enviou aos jogadores italianos antes da final de 1938 nada tinha de ambíguo: “vencer ou morrer”. João Goulart explicou à delegação que se dirigia ao Chile, em 1962, que a Copa do Mundo “faz os brasileiros esquecerem nossas dificuldades econômicas, e assim é mais preciosa que o arroz”. A ditadura militar acompanhou de perto a preparação para a Copa de 1970, esperando dividendos políticos do tricampeonato. O mesmo interesse foi dedicado pelos militares argentinos à organização da Copa de 1978. Mas o uso político de Copas do Mundo não é exclusividade de países sem tradição democrática. Na França de 1998 tanto o presidente direitista quanto o primeiro-ministro socialista esperavam que a Copa amenizasse a “fratura social”. Também movimentos não governamentais tentaram utilizar-se do prestígio da competição. Em fins de 1977 foi lançado, por meio do Le Monde, um movimento de boicote à Copa na Argentina para pressionar sua ditadura militar.

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O Brasil com sua paixão pelo futebol não poderia escapar à lógica histórica das Copas. Cada uma delas parece despertar o fraco sentimento nacional. Tanto o populismo de esquerda de Goulart celebrou em 1962 “a vitória da nação”, quanto a ditadura militar de direita procurou em 1970 associar-se ao tricampeonato. Os jogadores brasileiros nunca são simplesmente selecionados, como na maioria dos países, e sim “convocados” a servir a pátria. Como Dunga definiu na recente entrevista coletiva na qual anunciou o grupo para a próxima Copa, ali “vamos sofrer, vamos sangrar”. Nessa missão os jogadores “estão preparados para se doar e vencer pelo país”, pois “cada um que está aqui tem que ser patriota”. De maneira coerente, Dunga não se define como especialista em futebol (técnico ou treinador) e sim como “comandante da seleção”. Enquanto os italianos torcem pela Azzurra, os franceses pelos Bleus, os ingleses pelo English Team, os alemães pela Nationalmannschaft, os brasileiros torcem pelo Brasil. Ou seja, fazemos pequena distinção entre a seleção de futebol e o país. A vitória ou derrota de um parece ser a do outro. O auxiliar-técnico Jorginho explicitou tal concepção na mesma entrevista – a “seleção brasileira é nossa pátria”. O país é visto como um bloco único no qual não apenas o atleta deve ser patriota, todo cidadão também é de certa forma convocado: “peço que o torcedor goste do nosso país”, conclamou o comandante.

Enfim, para quem deseja não ser apenas sujeito da história, mas também agente, a Copa que se aproxima pode servir não somente para torcer como também para pensar o mundo em que vivemos.

Hilário Franco Júnior é professor da USP, autor dentre outros de A dança dos deuses. Futebol, sociedade e cultura, Companhia das Letras, 2007.

FONTE: Le Monde Diplomatique Brasil - Ano 3, n. 35, junho de 2010.

Copa do Mundo - A autoestima dos brasileiros



Futebol, definitivamente, não é só um jogo. É patrimônio cultural, mitologia contemporânea, criação artística coletiva. É ferramenta de inclusão social, instrumento de coesão nacional, elemento de construção da identidade coletiva. E um negócio fabuloso.

A Copa do Mundo é o ápice inconteste de todos esses aspectos. É o marco unificado no calendário de centenas de nações normalmente desencontradas na contagem do tempo. O direito de participar de uma Copa é disputado ao longo de vários anos (as eliminatórias sul-americanas começaram em outubro de 2007). O direito de sediar uma Copa, por período ainda mais extenso. A Rússia já defende sua candidatura a país sede de 2018, tendo como rivais Inglaterra, Espanha e Portugal (juntos), bem como Bélgica e Holanda. Estados Unidos, Qatar, Coreia, Japão e Austrália se oferecem para 2022.

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Trégua e anestesia

Os apelos à paixão e solidariedade não são meros artifícios. Assim como em outros grandes negócios – cinema, música – a exploração comercial não suprime os sentimentos e emoções que, de fato, acompanham a atividade.

Entrou para a história a trégua estabelecida durante uma guerra civil no antigo Congo Belga, em 1969, para que a delegação do Santos de Pelé pudesse transitar e jogar em segurança...

Em plena crise política, os hondurenhos deixaram suas diferenças de lado na noite em que o país se classificou para a Copa, e as ruas ficaram lotadas com a comemoração. Na Sérvia, a classificação para a Copa também propiciou raro momento de unidade e orgulho nacional.

Caso emblemático de injeção de ânimo foi a vitória da Alemanha na Copa de 1954 (retratada no filme “O Milagre de Berna”) quando o pais se encontrava em ruínas. Um segundo momento como esse foi quando a Alemanha sediou a Copa de 2006 e o povo exultou com a possibilidade de se mostrar amistoso e unido, 16 anos depois da queda do Muro. “Queremos demonstrar que somos um país democrático, que respeita a integridade humana”, disse Peter Struck, ministro da Defesa, em evento promovido pela Fundação Friedrich-Ebert, em sua sede em Berlim, pouco antes do início da Copa: “Does Football Rule The World?” (“O Futebol Rege o Mundo?”). Seu propósito era discutir os efeitos de grandes eventos esportivos para o conjunto da sociedade a curto e médio prazo.

Curiosamente, o aspecto puramente comercial não pareceu, na ocasião, tão bem resolvido quanto os candidatos a país sede acreditam ou dão a entender.

Os organizadores da Copa de 2002 na Coreia apresentaram o balanço de seus investimentos: as receitas com patrocinadores e ingressos não cobriram as despesas com o evento. O número esperado de turistas, 540 mil, não foi atingido – chegou-se a 450 mil. O incremento na atividade turística e comercial depois da Copa também não durou como esperavam. Portanto, os resultados “tangíveis” foram negativos – o que valeu foi o “intangível”: “o aumento da autoconfiança no país, um ‘upgrade’ no espírito de que ‘nós podemos’, uma vitrine para a divulgação de produtos e tecnologia reforçando nossa imagem no exterior”.

A conclusão dos representantes de Portugal (sede da Eurocopa 2004) e da França (Copa do Mundo de 1998) não foi diferente. Os eventos proporcionaram a aceleração de algumas obras e investimentos, mas a um custo altíssimo – inclusive o de manutenção, que é permanente.

Na Alemanha, a Copa ajudou a reformar e revitalizar estruturas antigas – o metrô, em Munique, havia sido construído para a Olimpíada de 1972 – e serviu como impulso para concluir projetos de infraestrutura por meio de parcerias entre governo e iniciativa privada. Mas os organizadores se ressentiam das condições leoninas impostas pela FIFA – que exige uma série de garantias governamentais e isenção tributária sobre todas as suas atividades no país. O fator “risco” é todo do país sede. O fator “lucro” é da FIFA, que recebe milhões (em direitos de transmissão, acima de tudo) sem risco algum. Em longo prazo, o desempenho econômico recente de países que foram sedes de grandes eventos demonstra, de forma clara, que o efeito de uma Copa ou Olimpíada pode ser tão volátil quanto a glória esportiva. Atenas recebeu os Jogos Olímpicos seis anos atrás e nem por isso a Grécia escapou de enorme crise. O Japão se debate com altas taxas de desemprego e déficit público altíssimo.

A caminho de sediar dois grandes eventos, o Brasil já não precisa seduzir a comissão julgadora, mas os investidores. Os benefícios para a autoestima dos brasileiros e prestígio internacional já se fazem sentir; não podemos pôr a perder esse que é o único ganho indiscutível. O desafio agora é dar transparência aos custos e à execução dos projetos. O aficionado por futebol sabe que a organização é a melhor moldura para o talento; que improviso funciona quando há entrosamento; que autoconfiança em excesso prejudica o desempenho, e que não adianta comemorar antes do fim do jogo. Que façamos uma boa Copa e que os ganhos sejam mesmo da nação, e não apenas dos proprietários da marca registrada.

Soninha é jornalista especializada em futebol, vereadora de São Paulo e integrante do Conselho Editorial de Le Monde Diplomatique Brasil.

FONTE: Le Monde Diplomatique Brasil - Ano 3, n. 35, junho de 2010.